sábado, janeiro 28, 2006

"Entre uma enorme quantidade de flores, há sempre uma especial""

Nunca fui grande admirador de flores. Nunca admirei muito a natureza. Nunca soube admirar...
Mas naquele dia estava triste e segui o conselho de um amigo, fui ver o pôr-do-sol.
Percorri estradas que pareciam não ter fim, passei por montanhas e vales e fui, decidido, rumo ao pôr-do-sol. Não tinha tempo a perder. O sol começava a baixar e eu corria cada vez mais depressa. Queria ver o pôr-do-sol de pertinho. Se me perguntarem por onde passei, não sei dizer. Só sei que percorri montanhas e vales e muitas estradas...
O sol ia sempre descendo. Eu corria, corria... mas o sol parecia correr mais depressa que eu...
Cheguei a um alto monte, á minha frente um precipício parecia querer engolir tudo o que se aproximava. Mas este monte era o ideal. Eu não podia avançar mais e dali avistava quilómetros e quilómetros á minha frente, mas sempre na esperança de que o sol se escondesse ali pertinho de mim. O sol estava quase a pôr-se. Á minha volta havia um silêncio, que a brisa perturbava de vez em quando assobiando baixinho. Estava quase na hora da "cerimónia". Eu estava a gostar daquele ambiente. Mas quando chegou a sua hora o sol pôs-se... lá ao fundo daquele horizonte. A minha vista só distinguia uma luz forte que parecia enterrar-se entre o céu e a terra. Ali estava eu, triste a observar aquele espectáculo. É verdade que era maravilhoso observar o pôr-do-sol, mas eu que esperava vê-lo ali pertinho de mim, só podia avistá-lo ao longe. Mas mesmo assim fiquei ali, triste a olhar o pôr-do-sol.
Quando já estava tudo escuro, decidi regressar ao meu canto. Toda a gente tem um canto. Eu também tinha o meu. Aquele canto onde eu chorava e ria, aquele canto onde desabafava e falava sozinho. Era o meu amigo, aliás, era o meu único amigo que me escutava e permanecia calado. Não aconselhava, não refutava, apenas escutava. Agora regressava rumo ao meu canto. Tinha corrido tanto para ver o pôr-do-sol de pertinho e enganei-me.
Pelo caminho caí várias vezes... estava tudo tão escuro! Comecei a desejar que o sol voltasse muito rápido. Depois caí mais uma vez. Ali fiquei caído... e adormeci. Quando acordei, a escuridão tinha desaparecido. O brilho do sol fazia-se chegar a todo o lado. Eu segui na direcção do meu canto. Acho que fiquei contente por ver de novo o sol que iluminava tudo á minha volta. Então retomei o meu caminho, mas com muita calma... fui admirando a natureza. Descobri que a natureza é maravilhosa. Tantas flores tão belas e cada uma diferente da outra. Campos verdes, pássaros que entoavam melodias maravilhosas. Entre as muitas flores uma chamou-me à atenção. Era uma flor bem pequena, mas era admirável. Parecia uma que eu já tinha conhecido. Não sei se a consigo descrever, e por melhor que o faça não fica nada parecida. Mas ela era pequena, tinha dois botões verdes e umas folhas que pareciam aconchegar esses botões. As pétalas de um tom avermelhado tornavam-na ainda mais bela. Eu parecia um miúdo de alguns meses a olhar para a luz ofuscante de um sorriso.
Fiquei tanto tempo a olhá-la. Primeiro de um lado, depois de outro e de frente. Foi a primeira vez que soube admirar a beleza de alguma coisa.
Depois tive de regressar ao meu canto. Demorei algum tempo, mas quando estava a chegar, vi uma flor exactamente igual àquela que eu tinha visto, só que esta última era minha vizinha. Morava mesmo pertinho de mim. Então decidi perder com ela a maior parte do meu tempo, porque ela era o meu tesouro. Algumas pessoas chamavam-me louco, mas eu nem ligava.
Aprendi a viver e a olhar a vida de uma forma positiva. Eu tinha nascido outra vez. Eu tinha descoberto que muitas vezes as coisas belas estão tão perto de nós que nós nem as vemos. Aquela flor tornou-se no meu canto e abriu-me os olhos. Quando estava triste, observava o pôr-do-sol, do meu canto, na companhia da minha flor. Sim, era minha. Já tinham passado alguns dias e ninguém a tinha reclamado. Agora a minha vida estava dependente da minha flor. Eu era livre e ao mesmo tempo estava preso àquela flor. Nunca mais voltei a estar sozinho, e transformei-me num grande admirador de flores. Aprendi a admirar a natureza.
A essa flor quis dar-lhe um nome... e porque foi com ela que eu aprendi a ler a natureza, e porque ela tinha dois botões verdes e umas pétalas de tom avermelhado... chamei-lhe Lena.



S.P.


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